segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Não há duas sem três!*

Joaquim Palminha Silva In A Defesa 30 Setembro 2010

Com o início da actual gestão municipal (em 2001), entramos num vestíbulo onde era suposto sorrir, com visível alegria e entusiasmo, um conjunto de ideias inovadoras (e convívio democrático, aberto, não exclusivista, capaz de aceitar o espírito crítico)… Afinal de contas, fomos vendo paulatinamente que não havia mais do que um “cabide” carregado de “chapéus” de toda a espécie. Enfi m, “chapéus há muitos!...”…
Expliquemo-nos…
Primeiro, surgiu a “ideia-inovadora” (2004) da “Évora-Moda” auto-promovida pela CME e outros “ilustres” parceiros da urbe. Isto é, a organização de um desfi le de “moda” com figurantes mais ou menos vestidos, e a exibição de uma série de mediocridades nacionais da TV e capas de revistas “cor-de-rosa”… Esta “parada” estapafúrdia foi inaugurada face ao templo romano, pelo que a exorbitância de decibéis e outra poluição ambiente na acrópole da cidade, transformaram a iniciativa num gesto vandálico de agressividade patrimonial que “arrepiou”, com toda a razão, alguns agentes culturais e foi objecto na altura de acesa discussão crítica na Comissão Municipal de Arte, Arqueologia e Defesa do Património. O mesmo disparate se repetiu noutra edição da “Évora-Moda”, na Praça de Giraldo, aí massacrando a fonte henriquina e a igreja de Santo Antão… Enfim, além do dispêndio financeiro e vários distúrbios culturais, esta iniciativa resultou numa espécie de “capote rasgado e chapéu roto”, retirados do tal “cabide”, colocando Évora alguns dias fora do recatado lugar de classificada pela UNESCO, para abancar na enxerga da foleirice nacional…
Depois, aconteceu a história caricata (2005) de um cavalheiro de nome Tristan Gillot (portador de passaporte belga) que, enquanto se apresentava como “príncipe” da Transilvânia (?), conseguia convencer a gestão municipal de que tinha capitais para erguer em Évora uma fábrica de pequenos aviões… e, nesse sentido, foi-lhe facultada a cedência de 2 688 m2 de terreno. Esta versão “alentejana” do “conto do vigário” acabou com o cavalheiro (referenciado pela INTERPOL como burlão internacional!) preso pelas autoridades, felizmente sem perigo de maior para os cofres da CME… E lá se foram, saídos do tal “cabide”, outro “capote rasgado” e mais um “chapéu roto”… Évora descia, então, da epopeia patrimonial para esse “crepúsculo” transtagano que é o anedotário alentejano…
Por fim, aparece-nos agora a ideia de “posicionar Évora como um centro cultural integrado nas grandes capitais mundiais do design”, segundo o texto do protocolo firmado entre as instituições Turismo do Alentejo, CME e um particular, por sinal Professor de design na Universidade de Évora e, no caso, proprietário da colecção de objectos a servir de acervo a um denominado “Museu do Design” industrial…
Curiosamente, “museu” a edificar no espaço do extinto Museu do Artesanato actual Centro de Artes Tradicionais, ignorando a existência deste mesmo espaço museológico e seu respectivo acervo, ainda que pálida imagem do que deveria ter sido um efectivo “museu do artesanato” alentejano, etc.. Entretanto, temos de dar conta da nossa perplexidade face à hipocrisia reinante, pois ninguém se atreve a dizer que Évora não necessita de um “Museu de Design” para nada! De resto, é “coisa” perfeitamente descontextualizada aqui e agora (compreendemos o perigo que envolve fazer esta afirmação)!…
Mas pense o leitor com alguma lógica: - Se porventura um Prof. da UE beneficiando de relações íntimas, de privilégio, com a gestão municipal, por “mania” ou gosto científico coleccionasse borboletas exóticas, teríamos obrigatoriamente um “museu da borboleta”, “integrado nas grandes capitais mundiais” das colecções de borboletas? … A actual gestão municipal empenha-se (é um facto!) em encontrar o maior número possível de inovações culturais ou lúdicas que, para além do que já se sabe, coloquem Évora no centro das atenções do turismo nacional e internacional, bem como tem procurado afanosamente atrair investimentos e criar emprego para a população, tal é o caso, por exemplo, da fábrica de origem brasileira de “componentes para aviões” que, como a “Feira de S. João”, todos os anos é inaugurada um pouco mais! Mas nunca mais se transforma em realidade!… Claro que é digno de registo o esforço da gestão municipal, embora não faça mais do que a sua obrigação!
Todavia, acreditamos que deve ser penoso para a gestão municipal organizar desfiles de “moda” que resultaram em fi ascos anunciados, acreditar no primeiro estrangeiro que lhe aparece a “vender a banha da cobra” e, por fi m, embandeirar entusiasmada no “paleio” de um “professor” na Universidade local (que não deve ter pesadelos nem pesos na consciência, pelos estragos que provoca!), que lhe “vendeu” a ideia da cidade vir a ser um “centro internacional” do design… Começando logo a “abrir” caminho pisando aqui e ali, incompatibilizando-se com os agentes culturais da urbe, pessoas singulares e instituições locais, resvalando para o ridículo nacional! Tudo isto deve ser penoso de sofrer para a actual gestão municipal, mas é muito mais penoso para o preocupado e inquieto cidadão eborense…
Na verdade, não há duas sem três! Decididamente, esta gestão municipal teima em fazer do seu trabalho, na área cultural e lúdica, um “cabide” para chapéus! Esta gestão municipal teima em nos desfigurar a cidade, porque se julga moderna, cosmopolita e de “excelência”, mas no meio de uma cidade de casas arruinadas, incapaz de eficácia na simples limpeza e restauro das calçadas urbanas, alterando-nos sem “autorização” referendária praças e jardins, atreve-se todavia a pretender ser “centro cultural” não se sabe do quê, acabando numa prática patética de “troca-tintas” disto e daquilo, que desgosta e envergonha a grande número de eborenses…
Por fi m, faz-se desantendida, não responde aos argumentos dos que a criticam publicamente, responde como “individuo” sofrendo de disfunção crónica, apesar de possuir neste mandato específico vereador da Cultura (lugar desempenhado até aqui pelo Presidente do Município), o seu suposto potencial cultural degrada-se a olhos vistos, a superficialidade e a inelutável leviandade que a acompanha tornou-se prática corrente… Como se diz (ou dizia) nas “passagens de nível” ferroviárias, aventamos este alerta aos cidadãos eborenses, sempre que tenham de se relacionar com actual gestão municipal, área cultural e não só: – PARE, ESCUTE E OLHE!!!
Para não serem atropelados pela asneira, celindrados pela crónica disfunção do raciocínio ou esmigalhados pela bacoquice mental!
“Chapéus há muitos”…
* Esta crónica volta a ser publicada com modificações, porque infelizmente a “estrutura” cultural bem como a mentalidade corrente, no seio do executivo municipal, continua inalterável… Isto é, se houve mudança foi para pior!

Sem comentários:

Enviar um comentário