sexta-feira, 9 de março de 2012

MADE, pago pelo contribuinte, tem 4 visitantes por dia

COMO NÃO SE FAZ …UMA EXPOSIÇÃO

Em 2007, para o programa da exposição permanente do Centro de Artes Tradicionais – Museu do Artesanato, foram elaboradas mais de uma dezena de curtas-metragens que registaram o processo de fabrico de uma série de artes emblemáticas do Distrito de Évora. O visitante podia, assim, além de contemplar as peças da exposição, conhecer as diversas técnicas envolvidas, por exemplo, no fabrico de um prato de olaria do Redondo, na moldagem de uma peça de estanho ou na manufactura de uma bota de couro, sempre através do trabalho emblemático de um artesão do distrito. A estratégia, muito comum na concepção das exposições para um público heterogéneo, com graus variados de formação e vivências, consistia em recolher e disponibilizar um conjunto variado de informações, em diversos suportes, para tornar as visitas aos museus mais atractivas e didácticas. Os pequenos filmes, as informações em textos de sala, as tabelas indicativas, os roteiros propostos de visita às oficinas nos diversos concelhos do distrito e o próprio catálogo da exposição permanente materializavam as ideias que presidiram à disposição das peças no espaço do Celeiro Comum, "transformando" uma colecção numa exposição que contava a evolução histórica do conceito de "Arte Popular" desde os finais do século XIX.

Como é já comum na museografia portuguesa nas duas últimas décadas, as vitrinas foram concebidas e executadas propositadamente para expor cada um dos conjuntos de peças, com dimensões muito variadas, ao mesmo tempo que conformavam o espaço depurado da arquitectura pré-industrial do Celeiro Comum. Indicavam trajectos, separavam conjuntos, individualizando com uma iluminação correcta as qualidades plásticas dos materiais. Uma escolha criteriosa de materiais, o aço escovado, o granito e o vidro suportaram esse discurso respeitoso para uma nova utilização do espaço histórico.

Confesso que tememos o pior quando ouvimos as primeiras declarações do coleccionador Paulo Parra sobre a sua fácil intenção de fazer articular uma colecção de design industrial do século XX com as peças dos artesãos alentejanos. E o pior confirmou-se. Agora, naquele espaço, faz-se crer que tudo é design, desde os artefactos da pedra polida até os nossos dias, e o conceito esvazia-se de significado e de coerência histórica. Sobram as peças quase mudas, transformadas em objectos para os quais não se conformou nenhum discurso. Mas nada justifica tamanho amadorismo na disposição da nova exposição que habita, desde Novembro de 2011, o espaço do Celeiro Comum. Vitrinas recicladas com papel auto-colante, peças amontoadas sem a mínima preocupação de escala em relação à vitrina que ocuparam, combinam-se alegremente com a ausência sistemática de informação sobre as peças e núcleos. Como qualificar a utilização dos anteriores suportes de informação de texto como suportes para os tapetes de Arraiolos, sem a mínima preocupação sobre a conservação das peças?

Tínhamos fundadas dúvidas de que o auto-proclamado Museu de Artesanato e Design de Évora pudesse trazer algum contributo para o estudo ou a preservação das artes tradicionais do Distrito de Évora, mas é verdadeiramente espantoso que também possa contribuir de maneira tão residual para o conhecimento e valorização do Design Industrial do século XX. O chamado MADE simplesmente não foi concebido para informar e instruir o público, que ignora de forma arrogante.

Não será essa a razão profunda de estar às moscas? Tem, em média, 4 visitantes por dia, ou seja, menos que o Centro de Artes Tradicionais (CAT) na fase final de agonia planeada em que lhe iam sendo retirados meios, funcionários e divulgação. A este ritmo, quando será que este atentado ao bom gosto e aos dinheiros públicos se tornará “economicamente rentável” como escreveram mo protocolo em que ofereceram aquele espaço à colecção privada do Senhor Parra a Câmara Municipal de Évora e a Entidade Regional de Turismo do Alentejo?

Antecipando estes resultados, a associação Perpetuar Tradições fez em Maio do ano passado uma comunicação à Comissão Europeia denunciando a destruição anunciada do Centro de Artes Tradicionais, e a intenção de utilizar os respectivos meios num outro projecto – o MADE – com manifesto desvio dos financiamentos públicos aplicados no CAT.

A Comissão Europeia abriu um processo e pediu os necessários esclarecimentos às autoridades portuguesas. A atabalhoada abertura do MADE em Novembro passado foi a reacção apressada da Entidade Regional de Turismo à comunicação da Comissão de Coordenação do Alentejo que considerava a possibilidade de declarar a ERT em incumprimento das suas obrigações contratuais face às entidades financiadoras, nomeadamente à União Europeia. De então para cá, assiste-se a um sistemático bloqueamento do processo, numa tentativa de impedir uma decisão até Julho deste ano, data em que o incumprimento da ERT pode prescrever.

A associação Perpetuar Tradições está atenta ao evoluir da questão e vai intervir para que as entidades competentes não se tornem cúmplices dessa tentativa de dilação.

Évora, 9 de Março de 2012.

Associação Perpetuar Tradições

A Direcção A. J. Carmelo Aires Celso Mangucci J. Andrade Santos Miguel Sampaio Tiago Cabeça