segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Évora - Futuro do Centro de Artes Tradicionais continua envolto em polémica

Estava previsto abrir as portas no Outono de 2010. Mas o novo Museu do Design e do Artesanato - «Colecção Paulo Parra», situado no espaço onde até agora funcionava o Centro de Artes Tradicionais (CAT), no antigo celeiro comum, continua fechado, devido ao arrastamento do processo e ao atraso nas obras. Entretanto, surgem alegadas contradições denunciadas pela «Perpetuar Tradições», associação de defesa do artesanato do Alentejo. A autarquia de Évora responde às acusações, pela voz da vereadora da Cultura, Cláudia Pereira.

Ana Clara Café Portugal | segunda-feira, 27 de Dezembro de 2010

A polémica levantada pela «Perpetuar Tradições» surge na sequência das declarações da vereadora da cultura da Câmara de Évora (CME), Cláudia Pereira, à Antena 1 em Outubro passado, quando a edil afirmou que a ideia de transformar o Centro de Artes Tradicionais em Museu do Design não partiu do município mas da Entidade Regional de Turismo do Alentejo (ERTA) e do coleccionador, Paulo Parra.

Tiago Cabeça, membro daquela associação, considera que tais declarações são de «uma estranha leveza, pela irresponsabilidade política de quem deveria velar pelo bem público, patrimonial e cultural».

«Bastará um privado bater-lhe à porta e pedir um edifício público para o ter? Sem concurso público? Sem estudos ou razões de fundo que o justifiquem? Parece que existe na Sr.ª vereadora `a convicção` que Évora se tornará uma ´Capital internacional do design`. Chegará isso?», questiona o responsável.

E acrescenta que a vereadora da Cultura da CME «alegou não ter dinheiro para manter o Centro de Artes Tradicionais ,antigo Museu de artesanato de Évora, que existe desde 1962, e a que estava dedicada uma funcionária apenas, mas propõem-se sustentar o putativo museu de design privado com um rancho dependente de cerca de uma dezena de pessoas».

Tiago Cabeça afirma que, a ser verdade que a ERTA, «num primeiro momento, se aproximou da autarquia de Évora no sentido de pedir auxílio para manter e prosseguir o projecto do Centro de Artes Tradicionais, e a câmara liminarmente o recusou, mostraria que o desprezo pela nossa cultura, história e tradição, bem como pelo dinheiro dos contribuintes, parte justamente da Câmara».

E vai mais longe, deixando a dúvida no ar: «se a condição de manter aquele espaço passa pela aniquilação do projecto do artesanato e sua substituição pela colecção privada de design industrial do século XX, daquele coleccionador, coloca-se-nos a questão: porquê?».

Tiago Cabeça recorda ainda que este novo espaço terá entre outras despesas (garantidas pela Câmara) cerca de uma dezena de pessoas a trabalhar. «Dificilmente a CME, considerando as graves dificuldades económicas que têm vindo a público, terá capacidade de o sustentar», garante, lembrando que para garantir a sua «alegada auto-sustentabilidade, numa estimativa optimista, necessitaria de mais de seis ou sete milhares de visitantes por mês. Seria difícil».

«Sobretudo porque quem procura o Alentejo certamente não procura Design Industrial do século XX. Restaria ser o próprio coleccionador a manter esse batalhão de gente e custos», sugere.

Vereadora responde
O Café Portugal contactou a vereadora da Cultura da autarquia de Évora, Cláudia Pereira, no sentido de perceber o que de facto se passou. A autarca começa por explicar que o espaço do Celeiro Comum, como é conhecido o edifício onde estava o Centro de Artes Tradicionais e onde se propõe instalar o Museu do Design é da tutela da ERTA.

«O coleccionador Paulo Parra deu a conhecer a Évora, no espaço municipal da Igreja de S. Vicente, em Julho de 2009, parte da sua colecção. São estes os três vértices desta relação», diz.

Adianta que o projecto museológico para o novo Museu chegou-lhe às mãos em Novembro de 2009, tendo, na altura, reunido com o Presidente da ERTA, Ceia da Silva, propondo aquele espaço do Celeiro Comum para a sua instalação.

«Nesse mesmo espaço reuni, pela primeira vez, em Dezembro de 2009, com o coleccionador e esclareci qual a intervenção a ser feita bem como a articulação entre o espólio existente e o novo espólio. Tendo aceite a proposta, esta foi levada a duas instâncias: à Comissão de Arte, Arqueologia e Defesa do Património, com apresentação do projecto museológico pelo coleccionador, e cuja deliberação tem carácter consultivo, pode apenas dela ser porta-voz quem a preside, ou seja a vereadora da Cultura, e é utilizado como parecer pelo executivo da CME», explica.

Nos termos da lei, salienta, foi levada a reunião pública de Câmara, em forma de protocolo, onde foi aprovada: «a proposta é exterior à CME e optou a CME por considerá-la uma mais-valia para o Concelho e apoiá-la com uma pequena intervenção inicial de execução interna, o transporte das peças, um funcionário e apoio logístico, num compromisso que durará até que o Museu tenha auto-sustentabilidade e nunca num prazo superior a 10 anos, uma novidade em protocolos assinados no passado entre a CME e outras entidades».

Atrasos
Sobre os atrasos da abertura do Museu, previsto para o Outono deste ano, Cláudia Pereira admite que o processo se arrastou «devido à necessidade de haver autorizações e pareceres para se proceder à alteração pelo Turismo do Alentejo do uso daquele espaço». Além disso, «pelo facto de se necessitar de algumas obras por parte da ERTA o que tem procedimentos a cumprir, o espaço encontra-se ainda encerrado». «Só depois desta intervenção serão feitas as intervenções pela CME: transporte das peças e instalação das vitrines», realça.

A vereadora sustenta ainda que neste espaço, para além dos dois acervos – o do artesanato e do design industrial, «ambos caracterizados por produções em série que aliam a forma à função, com uma preocupação estética que os torna objectos dignos de serem expostos e apreciados» – o coleccionador privado investirá «naquilo que é o mais caro em qualquer parte do mundo: pessoas qualificadas para tirarem mais e melhor partido daqueles objectos; haverá também um espaço de biblioteca sobre artesanato e design industrial; planificam-se intercâmbios entre este e outros museus de artesanato e de design internacionais com circulação de espólios».

«Não só Évora e o Alentejo ficarão a conhecer e a dar a conhecer objectos congéneres aos que estarão expostos, como os objectos originais do Alentejo serão levados a outras partes do Mundo», refere.

Por fim, Cláudia Pereira recorda que «a riqueza da dinamização de um espaço é essa mesma, tal como o que é interessante na salvaguarda da atractividade das manifestações culturais, como são as peças de artesanato e os objectos de design industrial, para além do seu estudo “arqueológico”, que as insere no seu tempo de origem refazendo a sua “biografia”».

Contactado pelo Café Portugal, Ceia da Silva, presidente da ERTA, não quis falar sobre o assunto, alegando que «falará na altura própria» sobre a polémica.

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