terça-feira, 27 de julho de 2010
Paulo Parra leva as suas canetas, pedras lascadas, cochos e iPods para Évora
Paulo Parra resume a sua colecção de cerca de 2500 peças de design em jeito de subtítulo de livro: "Da pedra lascada ao iPod". Agora, a colecção torna-se acervo. Vai para o novo Museu do Design - colecção Paulo Parra, em Évora, que hoje é apresentado na cidade alentejana e que deve abrir portas no início de 2011.
Há ali, naquela colecção de um estudante universitário curioso tornado cognome de museu de design, um manancial de "primeiros": a primeira caneta de tinta permanente, uma Waterman de 1884, a primeira esferográfica, o primeiro walkman, os primeiros computadores Apple, os primeiros telemóveis, rádios e até um canivete suíço do século XIX. À mistura com os primeiros vidros e porcelanas Vista Alegre (1840), peças de Bordalo Pinheiro ou da britânica Wedgewood e tarros (baldes de cortiça), cochos (conchas de cortiça pastoris) e outros utensílios alentejanos. E, a par das tais pedras lascadas, o potencial para ultrapassar polémicas aliando artesanato a design. É tudo uma questão de técnica, conta-nos Paulo Parra.
"Não existe uma diferença entre o artesanato e o design", postula. "Há é tecnologias diferentes. O cocho ou uma porcelana da Vista Alegre são utilitários testemunhos de uma evolução lógica dos seres humanos", diz ao P2 o director do curso de Design da Universidade de Évora e responsável pelos doutoramentos de Design de Equipamento da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. O tema surge não só pela convivência de artefactos como as pedras lascadas do Megalítico, peças da comunidade religiosa Shaker norte-americana (muito conhecida pelo seu contributo ao nível do mobiliário) e a colecção de electrodomésticos do designer Peter Behrens, expoente do modernismo, para a AEG, mas porque o novo museu se vai situar nas instalações do actual Centro de Artes Tradicionais de Évora.
A decisão da localização do museu, aprovada em reunião pública de câmara (PS) em Abril, mereceu contestação dos defensores da preservação de um espaço que acolhe o espólio de artesanato da Entidade Regional de Turismo. O edifício, no centro de Évora e gerido pelo Turismo do Alentejo, vai agora acolher o museu de design, e Parra defende que a organização cronológica da exposição permanente do futuro museu vai permitir a coexistência dos dois espólios e das duas actividades. Aliás, já levou a cabo vários trabalhos com artesãos - é lembrar a Sela Portuguesa, no Pavilhão de Portugal na Expo Saragoça 2008. "Acredito que muito da sobrevivência do artesanato tradicional pode passar pela colaboração com o design, são precisas pontes para unir designers e artesãos", disse.
A ideia é também descentralizar: "O design está em Lisboa, mas tem de começar a aparecer noutros pontos do país. Esta é uma tentativa de criar um outro pólo", diz Paulo Parra, cuja colecção chegou a estar pensada para se juntar ao espólio de Francisco Capelo (hoje acervo do Museu do Design e da Moda - Mude) no Centro Cultural de Belém. "Esse casamento não se deu." O Museu do Design - colecção Paulo Parra quer criar parcerias com o Mude e está já em contacto com outros museus de design alemães e brasileiros, a pensar em internacionalização.
O processo de instalação em Évora começou há cerca de ano e meio, muito graças à ligação à Universidade de Évora, cujo público, juntamente com o da cidade, é o principal alvo do museu. Depois há os turistas, que ali encontram algo de contemporâneo em contraponto com a oferta histórica da cidade. Além das cerca de 2500 peças, Paulo Parra vai separar-se com alguma melancolia da sua biblioteca de design, arquitectura e arte, que dará ao museu mais condições para, no futuro, se candidatar a integrar a rede do Instituto dos Museus e da Conservação, garantindo a valência de formação e investigação. Haverá uma loja e um auditório, e estão programadas conferências em articulação com o curso de Design de Évora, cujos alunos, bem como os da FBAUL, poderão ter ali à venda alguns trabalhos de projecto com parcerias empresariais.
In Público 26.07.2010 - 08:43 Por Joana Amaral Cardoso
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