sexta-feira, 21 de maio de 2010

Não há duas sem três?

“É certo que os maus exemplos vêm de cima e já tivemos uma ministra a dizer naturalmente que os “museus nascem e morrem” sem que fosse elucidada sobre a lei internacional e nacional que os considera “instituições de carácter permanente”.
As instituições culturais não são os mastros dos santos populares, que se armam e desarmam nas alturas certas, e as cidades, além de gente e espaço, são memória e instituições.”

Dr. Joaquim Caetano (ex-director do Museu de Évora), in jornal Público, 9/5/2010



Com o início da actual gestão municipal (em 2001), entramos num vestíbulo onde era suposto sorrir, com visível alegria e entusiasmo, um conjunto de ideias inovadoras (e convívio democrático, aberto, não exclusivista, capaz de aceitar o espírito crítico)… Afinal de contas, fomos vendo paulatinamente que não havia mais do que um “cabide”
carregado de “capotes e chapéus” de toda a espécie, cada conjunto mais rasgado e roto que o seguinte…

Expliquemo-nos…

Primeiro, surgiu a “ideia-inovadora” (2004) da “Évora-Moda”
auto-promovida pela CME e outros “ilustres” parceiros da urbe. Isto é, a organização de um desfile de “moda” com figurantes mais ou menos vestidos, e a exibição de uma série de mediocridades nacionais da TV e capas de revistas “cor-de-rosa”… Esta “parada” estapafúrdia foi inaugurada face ao templo romano, pelo que a exorbitância de decibéis e outra poluição ambiente na acrópole da cidade, transformaram a iniciativa num gesto vandálico de agressividade patrimonial que “arrepiou”, com toda a razão, alguns agentes culturais e foi objecto na altura de acesa discussão crítica na Comissão Municipal de Arte, Arqueologia e Defesa do Património. O mesmo disparate se repetiu noutra edição da “Évora- Moda”, na Praça de Giraldo, aí massacrando a fonte henriquina e a igreja de Stº. Antão… Enfim, além do dispêndio financeiro e vários distúrbios culturais, esta iniciativa resultou numa espécie de “capote rasgado e chapéu roto”, retirados do tal “cabide”, colocando Évora alguns dias fora do recatado lugar de classificada pela UNESCO, para abancar na enxerga da foleirice nacional…

Depois, aconteceu a história caricata (2005) de um cavalheiro de nome Tristan Gillot (portador de passaporte belga) que, enquanto se apresentava como “príncipe” da Transilvânia (?), conseguia convencer a gestão municipal de que tinha capitais para erguer em Évora uma fábrica de pequenos aviões… e, nesse sentido, foi-lhe facultada a cedência de 2.688 m2 de terreno. Esta versão “alentejana” do “conto do vigário” acabou com o cavalheiro (referenciado pela INTERPOL como burlão internacional!) preso pelas autoridades, felizmente sem perigo de maior para os cofres da CME… E lá se foram, saídos do tal “cabide”, outro “capote rasgado” e mais um “chapéu roto”… Évora descia, então, da epopeia patrimonial para esse “crepúsculo” transtagano que é o anedotário alentejano…

Por fim, aparece-nos agora a ideia de “posicionar Évora como um centro cultural integrado nas grandes capitais mundiais do design”, segundo o texto do protocolo firmado entre as instituições Turismo do Alentejo, CME e um particular, por sinal Professor de design na Universidade de Évora e, no caso, proprietário da colecção de objectos a servir de acervo a um denominado “Museu do Design” industrial…

Curiosamente, “museu” a edificar no espaço do Museu do Artesanato/Centro de Artes Tradicionais, ignorando a existência deste mesmo espaço museológico e seu respectivo acervo, ainda que pálida imagem do que deveria ter sido um efectivo “museu do artesanato”
alentejano, etc..

Entretanto, temos de dar conta da nossa perplexidade face à hipocrisia reinante, pois ninguém se atreve a dizer que Évora não necessita de um “Museu de Design” para nada! De resto, é “coisa” perfeitamente descontextualizada aqui e agora (compreendemos o perigo que envolve fazer esta afirmação)!…

Mas pense o leitor com alguma lógica: - Se porventura um Prof. da UE beneficiando de relações íntimas, de privilégio, com a gestão municipal, por “mania” ou gosto científico coleccionasse borboletas exóticas, teríamos obrigatoriamente um “museu da borboleta”, “integrado nas grandes capitais mundiais” das colecções de borboletas?


A actual gestão municipal empenha-se (é um facto!) em encontrar o maior número possível de inovações culturais ou lúdicas que, para além do que já se sabe, coloquem Évora no centro das atenções do turismo nacional e internacional, bem como tem procurado afanosamente atrair investimentos e criar emprego para a população… Num e noutro caso, é digno de registo o esforço da gestão municipal, embora não faça mais do que a sua obrigação!

Todavia, acreditamos que deve ser penoso para a gestão municipal organizar desfiles de “moda” que resultaram em fiascos anunciados, acreditar no primeiro estrangeiro que lhe aparece a “vender a banha da cobra” e, por fim, embandeirar entusiasmada (vésperas dos santos populares), de “arco e balão”, no “paleio” de um tal “de professor” na Universidade local (que não deve ter pesadelos nem pesos na consciência, pelos estragos que provoca!), que lhe “vendeu” a ideia da cidade vir a ser um “centro internacional” do design… Começando logo a “abrir” caminho pisando aqui e ali, incompatibilizando-se com os agentes culturais da urbe, pessoas singulares e instituições locais, resvalando para o ridículo nacional! Tudo isto deve ser penoso de sofrer para a actual gestão municipal, mas é muito mais penoso para o preocupado e inquieto cidadão eborense…

Na verdade, não há duas sem três! Decididamente, esta gestão municipal teima em fazer do seu trabalho, na área cultural e lúdica, um “cabide”
de “capotes rasgados e chapéus rotos”!

Esta gestão municipal teima em nos desfigurar a cidade, porque se julga moderna, cosmopolita e de “excelência”, mas no meio de uma cidade de casas arruinadas, incapaz de eficácia na simples limpeza e restauro das calçadas urbanas, alterando-nos sem “autorização”
referendária praças e jardins, atreve-se todavia a pretender ser “centro cultural” não se sabe do quê, acabando numa prática patética de “troca-tintas” disto e daquilo, que desgosta e envergonha grande maioria de eborenses, incluindo parte do seu próprio eleitorado…

Como se diz (ou dizia) nas “passagens de nivel” ferroviárias, aventamos este aviso à actual gestão municipal – PARE, ESCUTE E OLHE!

Palminha da Silva in A defesa 19 Maio de 2010

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